Consumo de álcool tem relação com danos cerebrais ligados à demência, mostra pesquisa da USP

Estudo da USP identifica alterações cerebrais em consumidores moderados e intensos de bebida alcoólica; dados reforçam alerta da OMS sobre riscos da ingestão de álcool

Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) identificou uma associação entre o consumo de álcool e alterações cerebrais relacionadas à demência. A pesquisa analisou 1.781 cérebros de pessoas autopsiadas no Serviço de Verificação de Óbitos da Capital (SVO), vinculadas ao Biobanco para Estudos do Envelhecimento da instituição. Os resultados foram publicados no início de abril na revista Neurology, da Academia Americana de Neurologia.

As análises mostraram que tanto o consumo moderado quanto o intenso de álcool – definido como oito ou mais doses por semana – foram associados à presença de arteriosclerose hialina e emaranhados neurofibrilares de tau, estruturas ligadas à demência vascular e à doença de Alzheimer. Esses marcadores foram encontrados inclusive em pessoas que haviam cessado o consumo antes da morte.

Além das alterações microscópicas, ex-consumidores intensos de álcool apresentaram menor proporção de massa cerebral em relação à altura e maiores chances de prejuízo cognitivo, segundo informações fornecidas por familiares dos falecidos. As respostas foram obtidas por meio de questionário validado, capaz de indicar sinais de declínio cognitivo.

Embora a pesquisa não estabeleça relação de causa e efeito entre o álcool e as alterações observadas, os dados se destacam por terem sido obtidos por meio de análise direta de tecidos cerebrais, o que fortalece a associação. A maioria dos estudos anteriores sobre o tema foi baseada em exames de imagem e relatórios clínicos, com resultados variados.

O estudo é relevante também por utilizar amostras de brasileiros com baixa escolaridade e origem miscigenada, perfil comum em países de renda média e baixa. Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), dois terços das pessoas com demência viverão nesses países nas próximas décadas.

De acordo com o primeiro autor do trabalho, Alberto Justo, os achados indicam que marcadores associados à demência estão presentes mesmo entre consumidores moderados. Justo também ressalta que o declínio cognitivo foi identificado em todos os grupos que ingeriam álcool, incluindo aqueles que haviam parado de beber antes do óbito.

A OMS declarou em 2023 que não existe nível seguro para o consumo de álcool, citando o aumento do risco para diversos tipos de câncer. O novo estudo da USP reforça a necessidade de atenção aos impactos da bebida sobre o cérebro, em uma população que até então era pouco representada em pesquisas dessa natureza.

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