Nesta semana tive o privilégio de bater um papo com uma profissional versátil e multimídia. Cecilia é nascida no bairro da Santa Cecília, centro de São Paulo e foi criada, residindo até hoje na zona leste da cidade… Com 27 anos a artista é formada no curso de bacharelado em Rádio, TV e Internet pela Universidade Anhembi Morumbi. Dentre seus professores houveram aulas com o conceituado Elmo Francfort que já redigiu livros sobre a história da televisão, dentre eles da TV GAZETA SP, TV TUPI e REDE MANCHETE. (Atualmente ele é diretor do museu brasileiro de rádio e televisão) também é DJ (Formada pelo SENAC) e Produtora Musical. Cecy Nogueira, é multipotencial. Desde os dois anos de idade demonstrou interesse por fotografia. Já fotografava na câmera analógica simples de sua mãe. Nessa época começou a interessar-se por música. Com o passar dos anos tentou tocar diversos instrumentos como violão, guitarra, trompete e flauta doce, sempre com foco no rock. Dos oito anos até os onze cantou em coral, mas foi aos quinze anos que se apaixonou fervorosamente por cinema. Ela fez seu trabalho de conclusão de curso do ensino médio mostrando para todos como um filme realmente era produzido; até tentou rodar um filme no colégio, mas seu primeiro curta, intitulado “Reaper”, só saiu quando fez seu bacharelado na Universidade Anhembi Morumbi onde também escreveu artigo de iniciação científica. Essa sua dedicação e paixão resultou na obtenção de um prêmio ao final do curso. Foi eleita uma das oito melhores alunas do curso de todo o Brasil.
Devido a crise sanitária global que afetou o planeta e toda a sociedade não houve cerimônia de premiação nem colação. O prêmio veio apenas junto com diploma dentro de um envelope. Após o período pandêmico iniciou seus trabalhos em uma produtora como editora de vídeo. Nem tudo são maravilhas… Ao encerrar esse ciclo, Cecy entrou em profunda depressão (doença que a assombra desde os doze anos). Ela Passou quase um ano na cama, quando em súbito recebeu uma bolsa para estudar discotecagem no SENAC. Sem saber o que um DJ faz ou a manusear os equipamentos na época, não entendia nada de música eletrônica. A música lhe tirou da cama. Cecilia concluiu o curso de DJ despretensiosa, quando começou a acompanhar seu amigo que a levava para as festas, DJ Boloffac. Ele lhe apresentou ao universo da música eletrônica e conseguiu seu primeiro line. Em menos de um ano que havia descoberto o que é ser DJ já tocava com grandes nomes da cena eletrônica paulistana e brasileira, como o icônico DJ Mau Mau e o DJ L-side. Com seu ímpeto desafiador e viés empreendedora produziu sua primeira festa, denominada “Memória Curta” que ocorreu em maio desse ano (2025). A estética foi focada no solarpunk, levando o conceito de esquecermos as coisas ruins para apenas celebrar e ser feliz.
Cecy é fundadora e CEO da Eternix Produções, sua produtora audiovisual independente. A artista lançou recentemente sua primeira música oficial com a produção de um videoclipe chamada “A Dor Amarga Amor Esmaga”. O mesmo foi dirigido por Siao Feerum. Esse som pode ser definido por Tech House nostálgico com elementos de guitarra e um verso de um de seus poemas antigos cantado por IA, single principal de seu álbum “Amores Mortos”. Ele vem acompanhado de seu segundo curta-metragem autoral, uma obra surrealista e experimental intitulada “Lembrança de uma Lembrança”. Cecy Nogueira é uma artista em ascensão com múltiplos talentos que ainda tem muito para nos mostrar, e ainda vamos ouvir falar muito dela. Enquanto isso acompanhem e conheçam um pouco mais sobre a mesma.
Aldiéres Silva: Satisfação em poder entrevistá-la. Achei interessante o fato de você ter nascido na Santa Cecília e se chamar Cecília. A escolha do seu nome tem alguma ligação com o bairro ou algo religioso que remeta a escolha de seu nome?
Cecy Nogueira: É uma satisfação conceder essa entrevista à vocês do Jornal Panorâmico. Na realidade a escolha do meu nome partiu do meu pai. Ele escolheu porque achou bonito. Não possui nenhuma ligação ou referência ao bairro ou até mesmo a santa. O engraçado é que caiu como uma coincidência por eu ter nascido na Santa Cecília e ela ser a padroeira dos músicos. DJ é meio que isso, um “padroeiro dos músicos” porém não tem ligação uma coisa com a outra em relação a origem do meu nome. Não houve inspiração religiosa e também não tem influências de eu ter nascido no bairro (risos)… Foi uma coincidência mesmo.
Aldiéres Silva: Quais estilos cinematográficos mais te agradam e que você busca sempre ter como referência em seus trabalhos? Te garanto que as produções que vi são instigantes e valem a pena quem não conferiu, acompanhar!
Cecy Nogueira: Eu não tenho estilos cinematográficos específicos que eu me baseie em meus trabalhos… Em nenhum dos meus trabalhos. Eu sou uma artista! portanto tudo para mim pode se tornar referência. Desde comida, filmes, fotos, desenhos, livros, alguma artes… Qualquer coisa pode ser algo que me dê referências… Uma música, um sabor… Qualquer coisa pode ser referência. Aliás tudo é uma referência na mão de um artista, porém me baseio muito na natureza. Nos ciclos da natureza… Gosto de introduzir elementos psicológicos, sobrenaturais, coisas estranhas que surgem e desaparecem. Coisas que não ocorrem em nosso “mundo natural”. Gosto de valorizar também as performances, até mais que os diálogos porque afinal é uma arte. Então por que ela precisa ser igual ao mundo natural exatamente? Podemos incluir coisas diferenciadas, né?! Gosto muito de abordar temas relacionados à saúde mental, cura interna, resgate do nosso interior… Por exemplo o filme Reaper que eu produzi na faculdade eu optei pelo expressionismo alemão como estética, pensando na história pois possui elemento sobrenatural o qual fica ambíguo e surgem questionamento e interpretações como: “Será que é um elemento sobrenatural mesmo?! Será que é um ser ou uma criatura?! ou a personificação da depressão dela. Uma materialização de um ser negativo?! A estética foi pensada através de pesquisa para seguir a história. (Não que eu me baseie sempre, especificamente no expressionismo alemão) Achei que caberia esse estilo na produção do filme. Minha inspiração veio através do filme “O Gabinete do Dr. Caligari”, que não era colorido mas que eu quis colocar coisas bem fortes, como por exemplo luzes bem marcadas, maquiagem bem forte. O meu filme Reaper… Ele é muito bonito! … Até hoje o acho muito bonito.
Aldiéres Silva: Na música te conheci uma vez quando toquei como DJ convidado no GB Drinks no ano de 2023. Depois em 2024 estivemos no mesmo line do Tá Loka Meu Bem by Peppo Santigo no mesmo GB Drinks. (Infelizmente devido a minha agenda não consegui acompanhar sua apresentação mas vi vídeos do seu set). Quais estilos mais combinam com essa sua personalidade versátil? Quais referências você busca para emocionar o público na pista?
Cecy Nogueira: Na música como DJ, basicamente curto muito tocar a vertente TECH HOUSE porém gosto de misturar também. Por exemplo tocar um House, Disco, House com elementos de jazz e músicas que tenham esses elementos, batidas góticas com uma sonoridade marcante dos sintetizadores, algo mais dark… Vai depender muito das circunstâncias, momento, público, da pista. Vai depender também muito da minha vibe, do meu sentimento no dia. Por exemplo posso estar mais fechada e com isso seguir uma linha mais gótica, mais dark… Posso estar mais extrovertida e acompanhando essa vibe vir um performance voltada ao house e disco. Basicamente a minha linha é o tech house e dentro disso eu transito entre outros elementos, outras referências como um elemento de uma coisa misturada com outra sempre tendo como linha o tech house. Gosto muito de produtores de música eletrônica brasileiros
Aldiéres Silva: Explane um pouco sobre esses seus novos projetos. Tanto o “A dor amarga amor esmaga” quanto o “lembrança de uma lembrança”.
Cecy Nogueira: A música A dor amarga amor esmaga veio de um poema antigo escrito há muito tempo atrás, quando ainda cursava o ensino médio. Período quando estamos com os hormônios e sentimentos a flor da pele. Sobre relacionamentos que eu tive (coisa de adolescente). O poema ficou bom. Redigi e deixei lá! Com o passar do tempo e após eu ter me tornado DJ surgiu uma vontade de começar a produzir músicas autorais e com isso reencontrei esses textos, inclusive esse poema e mais algumas coisas aí eu pensei nossa que legal?! Aproveitei e coloquei a inteligência artificial para ler esse poema. O que ficou legal mesmo e pude aproveitar foi apenas a frase, o qual aproveitei para a música. Eu já estava ali realizando algumas pesquisas sobre a estrutura do house e aproveitei e coloquei ali a letra que a IA tinha falado… É interessante que até a própria produção musical tem elementos que eu já tinha no meu passado como riffs de guitarra, sintetizadores com sonoridade gótica e as batidas do house que com essas junções acabou sendo transformado em tech house, que é algo mais atual, mais presente na minha vida. É uma produção bem autoral e introspectiva.
Em relação ao Lembrança de uma lembrança é um curta metragem surrealista que também possui esse viés de trabalhar sombras, de trabalhar uma cura interna, de trabalhar traumas do passado entretanto o A dor amarga amor esmaga ficou mais como um espectro, afinal aborda sobre relações, sentimentos que não existem mais… Coisas bem do passado mesmo, que não existem mais. O poema ficou legal, interessante e acredito que encaixou bem na música. Ficou bonito… O videoclipe é meio que isso. São espectros, como fantasmas do passado… O Lembrança de uma lembrança é a história de uma personagem que está vivendo esse resgate dos traumas, essa cura do que ela vivenciou, cura do feminino… das dores que ela sofreu no passado e esse processo ocorre todo no mental dela. Tudo no subconsciente dela. Por isso a narrativa é algo muito diferente, digamos assim. Os elementos de cena aparecem e desaparecem. É uma produção bem experimental. O filme possui características focadas em performances com a ausência de diálogos (Não posso contar o final do filme (risos)). No meu casting conto com a Vitória. Além de atriz ela também é bailarina então tem ali a dança, a performance corporal, as expressões… O filme segue nessa linha com a ausência de diálogos e com ênfase na interpretação de expressões e performances físicas para expressar sentimentos, emoções e retratar situações. Os pensares são bem parecidos com temas muito semelhantes, tanto a música quanto o videoclipe. Acredito que seja um momento que eu venho a trabalhar essas sombras através dessas expressões artísticas.
Aldiéres Silva: Muitos são críticos de músicas brasileiras quanto de filmes brasileiros. Esse ano após muitas tentativas, Walter Salles conseguiu enfim ganhar um Oscar pelo Brasil com “Eu ainda estou aqui” e as músicas periféricas brasileiras ganham ascensão internacional, como por exemplo com edições do Boiler Room e spotify classificando alguns gêneros buscando novos ouvintes. Como você enxerga esse cenário, tanto no cinema brasileiro quanto na nova Música Popular Brasileira, menos elitizada e mais popularesca?
Cecy Nogueira: Bom… Com relação ao cinema brasileiro acho que esse momento é ótimo para oportunidades. Não é de hoje que cinema nacional vem ganhando destaque e mostra sua qualidade. No passado produções como Central do Brasil e Cidade de Deus, por exemplo são longa metragens que mereciam de fato ganhar um Oscar. A cultura brasileira está sendo mais difundida no exterior, criando-se uma popularidade muito grande lá fora! Não é que as coisas estão deixando de ser elitizadas… É o cinema brasileiro que esta ficando mais elitizado! Ainda não somos uma Hollywood mas em comparação a outros períodos estamos bem maiores do que já fomos. Com isso vem um maior reconhecimento à setor.
Sobre a MPB (Música Popular Brasileira) ela é um estilo musical dos acadêmicos. Por muitos anos ela sempre esteve nesse patamar. Apesar que em sua nomenclatura há a palavra popular, ela sempre foi direcionada às elites. Referente ao formato Boiler Room, é modelo de festa que teve origem na Europa que quando chegou no Brasil já desembarcou por aqui consolidada. Ele já é bem comercial. Podemos observar grandes nomes da cena nacional tocando, como também da cena internacional quando esses eventos são realizados por lá quanto por aqui. Posso afirmar que essa festa não é popular. Já sobre as plataformas de streaming voltadas a música ela é ideal para favorecer novos musicos que iniciam sua trajetória. Com isso cria-se novas oportunidades. Nisso não é que as coisas estão deixando de ser elitizadas mas que estamos tendo mais oportunidades. No próprio cinema. Com a conquista desse Oscar é um respiro… Tipo “nossa finalmente nos viram. Estamos aqui”. É uma grande oportunidade para quem atua e produz no cinema brasileiro. Isso contribui também para a abertura de portas para o mercado internacional na difusão de trabalhos em festivais, coproduções. É uma oportunidade que venho através desse reconhecimento!
Aldiéres Silva: Quais foram os seus maiores desafios para você chegar ao seu atual momento profissional e que queira compartilhar aos nossos leitores?
Cecy Nogueira: Claro… Há aqueles desafios técnicos, tipo. “Ah aquele equipamento deu problema” ou “Isso aqui não funciona direito” porém essas circunstâncias são mais fáceis de se vencer em contrapartida dos desafios internos. Se a sua mente não estiver bem, nós não conseguimos trabalhar com o melhor equipamento do mundo. Então o nosso maior desafio é vencer a nossa própria mente para você fazer aquilo que você quer fazer. É você não dar atenção muitas vezes a interpelações de terceiros, afinal críticas sempre vão existir, mesmo daquelas pessoas que não produzem ou alimentam inveja dentro de si! Elas não querem te ajudar ou vê-los melhor que elas… É do ser humano isso!
Aldiéres Silva: Qual dica você tem a passar para quem pretende ser um (a) produtor (a) audiovisual/cineasta ou quem pretende seguir na carreira de DJ e/ou de produtor (a) musical??
Cecy Nogueira: A minha dica que posso dar para qualquer pessoa que almeja qualquer desafio, sonho, etc. Estude! Isso mesmo, estude! Vai ter que ler, ler, estudar, buscar referência, praticar, estudar, ler, ler, ler… Então estude o máximo que você puder. Pratique o máximo que puder também. Se é isso mesmo que você quer, faça isso a sua vida! É isso que será, a sua vida! então estude, dedique-se o maior tempo possível por seus objetivos. Estudo, Prática e estude! É só isso. Não existe fórmula mágica ou receita de bolos. É sentar na mesa, pegar um livro e estudar! É básico! Sempre foi assim para qualquer coisa que queiramos aprender. Nisso é essencial estudar, praticar e produzir. Você vai precisar errar muito para poder aprender. Faz parte do processo, não tem como fugir. No caso dos DJs: “Ah que vergonha, eu errei a virada”. Isso acontece… Passou já era. Ser DJ me ajudou nisso, a perder a vergonha, perder o medo de errar, perder o medo de ser visto tentando fazer algo. Por exemplo um DJ famoso e já consolidado na cena há muitos anos também erra viradas… Sai “sambando” e “batendo panelas”… acontece. Isso ocorre com qualquer um. É questão de treino, prática, estudo…
Aldiéres Silva: Deixe suas considerações finais aos nossos leitores.
Cecy Nogueira: É isso… Agradeço a oportunidade a todos do Jornal Panorâmico de Itapetininga pela oportunidade de ter sido entrevistada por vocês. Me sigam nas minhas redes sociais: Instagram pessoal: @cecy_nogueira, da minha produtora @eternixproducoes e da minha carreira de DJ @djcecy_
É isso pessoal muito obrigada pelo espaço e até a próxima!
Como lemos e acompanhamos, Cecy venceu desafios que foram apresentados e venceu com entusiasmo e coragem. Enquanto muitos reclamam e idealizam outros encaram a realidade. Apesar dos desafios lutam e adquirem experiência para compartilhar com os interessados que buscam vencer. A primeira vitória vem de dentro ao acreditarmos que as coisas são possíveis e isso nos motiva a mudar realidades. Há derrotas que são vitórias no médio e longo prazo. A Cecilia é um exemplo. Há muito a ser explorado por ela. Que essa entrevista tenha te inspirado…


