A geração Z não se recordará mas já existiram transmissões clandestinas de radiodifusão no Brasil e no mundo. Esse movimento de contra cultura era denominada de mídia livre. Essa “liberdade” era contra a censura do Estado nos conteúdos dessas empresas. O mais comum eram estações de rádios sendo transmitidas de porões, sótãos, quintais e em alguns casos televisões também. Em ambas situações no auge das transmissões analógicas, essas estações invadiam as frequências e dials alheios em busca de ter um espaço alternativo de comunicação. Isso ocorria em um período que não se pensava em meios de comunicação alternativos, públicos, comunitários ou estatais… Apenas comerciais e algumas redes públicas, como as pioneiras TV Cultura de São Paulo e a TVE Brasil do Rio de Janeiro. Com o tempo e a maior flexibilidade do governo, além da chegada da TV por assinatura, a clandestinidade da radiodifusão foram praticamente banidas, porém através de algumas pesquisas venho aqui compartilhar para os leitores (as) (alguns vão se recordar e outros conhecer como era essa ambiente criminalizado e de constante fuga do sistema).
Um clássico do audiovisual ocorreu nos Estados Unidos no fim da década de 1980. Em específico no ano de 1987. O evento é conhecido como “O Incidente Max Headroom”. Um hijacker (sequestrador de sinais e navegações) invadiu o sinal de duas emissoras de televisão da cidade de Chicago, casos da WGN-TV (Canal 9) e a WTTW (Canal 11), no dia 22 de novembro de 1987, causando repercussões em todo país. O hacker e os seus eventuais cúmplices nunca foram presos e nem identificados. Até os dias atuais não se sabe como o sinal das emissoras de TV foi invadido, nem as motivações do hacker. Os engenheiros da WTTW acreditaram que o sequestro do sinal foi realizado através da operação de um transmissor de radiofrequência nas proximidades, sobrepondo o sinal da emissora de TV. No youtube é possível pesquisar sobre o fato. Ambas emissoras tiveram seu “sinal sequestrado” no mesmo dia por um intervalo aproximado de 2 horas de diferença. Na WGNTV ocorreu a interrupção durante a exibição no noticiário noturno, enquanto na WTTW era exibido episódio da serie britânica Doctor Who.
No Brasil também há relatos dessas ações… Foi mais comum com rádios, mas há registros de existências de televisões clandestinas que burlavam o governo para emitir suas sátiras, críticas e etc (Lembrando que até hoje para se ter um sinal aberto de televisão é necessário sabatinas e garantias junto ao governo federal para assim ter sua emissora funcionando gratuitamente para milhões de espectadores). Os casos mais conhecidos são a TV 3 Antena do Rio de Janeiro e a TV Cubo de São Paulo.
A TV 3 Antena foi uma emissora clandestina de televisão brasileira sediada no Rio de Janeiro. Operou através do canal 8 VHF. Fez parte de um movimento que incentivou a operação de diversas emissoras clandestinas de televisão entre o final da década de 1980 e o início da década de 1990 no eixo Rio-São Paulo. O surgimento de uma emissora clandestina de televisão no RJ já havia acontecido em 1986, por meio da criação da TV Vento Levou, que operava no canal 3 VHF. A emissora estreou em 1º de novembro, quando inseriu uma interferência no áudio da TV Globo Rio de Janeiro durante a transmissão do Jornal Nacional que anunciava uma “situação de emergência” e pedia aos telespectadores que sintonizassem o canal 3, onde transmitia um protesto contra o “monopólio” da emissora. O canal contava com uma equipe de 15 pessoas e um sinal que alcançava inicialmente duas ruas de Copacabana . Pouco tempo depois, a instalação de um transmissor mais potente permitiu a expansão da cobertura para toda a Zona Sul do município.
A TV Cubo invadia sinais de emissoras de São Paulo nos anos 80 usando três aparelhos fáceis de encontrar, a emissora clandestina foi uma das primeiras do país a hackear o sinal de canais abertos. Em 1986, uma emissora peculiar aproveitava um buraco nas frequências da cidade de São Paulo para criar uma programação clandestina, livre de qualquer autorização do DENTEL, o antigo Departamento Nacional de Telecomunicações, sendo o órgão executivo do Ministério das Comunicações, responsável também pela regulamentação e vigilância de concessões de TV. Esse Depto foi extinto durante o governo de Fernando Collor de Mello em 1990. Já na administração Fernando Henrique Cardoso, no ano de 1997 foi criada a ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações) para a fiscalização do setor. No ponto alto de sua clandestinidade, a frequência do canal 3 acabou sendo ocupada pela TV Cubo, que não apenas não cumpria nenhuma norma do DENTEL para ocupar a faixa, como nunca recebeu uma concessão. Dessa forma, entrava no ar um dos casos mais antigos de TV pirata no Brasil, na época em que o processo era bem mais fácil do que nos dias atuais, com o advento das transmissões a cabo, via satélite e com o padrão digital. No tempo das parabólicas, bastava um aparelho de videocassete que, ligado a um amplificador de sinais, poderia transformar uma antena receptora em uma emissora, para sobrepor a imagem de um canal real caso a força do sinal pirata fosse maior do que da emissora licenciada nos padrões da lei.
Na região temos o registro das emissões da Rádio Espectro de Sorocaba. Conforme o programa DOCUMENTO VERDADE, exibido pela extinta Rede Manchete noticiou. No ano de 1982 foram registrados a existência de mais de 100 rádios piratas na cidade. Mesmo após condutas repressivas algumas estações conseguiram resistir e permanecer no ar. O desenvolvimento tecnológico na época de algumas rádios livres permitiram que suas transmissões ultrapassassem os limites municipais e realizassem transmissões em cadeia com outras estações clandestinas, como ocorreu com a STREET SOM OCIDENTAL FM que operou no dial 102,9. Foi em Sorocaba no ano de 1985 que surgiu a TV LIVRE de Sorocaba, idealizada por um radialista e um técnico de eletrônica. Ela foi a inspiração para a criação da TV 3 Antena do RJ e a TV Cubo de SP. Ela funcionou na frequência 16 UHF.
Em Itapetininga temos o registro do surgimento pioneiro de uma TV Comunitária e legalizada. Ela funcionou no Canal 44 UHF. Se chamava SP SUL TV. Suas primeiras atividades ocorreram no ano de 1990 e fez com que os itapetininganos tivessem espaço com conteúdo próprio e comunitário. Muitas figuras ilustres dos meios de comunicação local foram pioneiros, casos por exemplo da família Abrão, dentre elas a Tutti da rádio Super Difusora, nossa parceira aqui do Jornal Panorâmico. A SP SUL TV existiu até 1999. Com o tempo surgiu a TVI (TV Itapetininga) que podem ser sintonizadas por algumas operadoras de TVs por assinatura e também pela internet e o YOUTUBE. Emissoras pioneiras em um período que não era comum haver propósitos e conteúdos não comerciais.
Com o tempo e a vitória do partido de esquerda que atualmente governa o país, houveram a possibilidade de uma democratização dos meios de comunicação como sempre exigiram. Por exemplo em São Bernardo do Campo há uma concessão para a Central Única dos Trabalhadores (CUT). Sua emissora é denominada por TVT (TV dos Trabalhadores) e funciona em sinal aberto na região metropolitana de São Paulo, na frequência 44.1. Além da TVT surgiram outras pelo país e também o fortalecimento das TVs Comunitárias, Públicas e Estatais… Sem contar as TVs por assinatura e On Demand via streaming que hoje são uma realidade. É questão de tempo, por exemplo para a TV Aberta como conhecemos ser mais um assunto da história ou coisas relacionadas a museus para a preservação do histórico social, de comunicação e humano.




